Fikções, opinadelas e cenas que tais: Tortura contemporânea.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Tortura contemporânea.

Texto anónimo, gostaria de conhecer a douta autora :):

"Então lá decidi eu, por livre e espontânea pressão das minhas amigas, render-me à depilação radical.
Disseram que eu me ia sentir mais magra dez quilos, mas não me parece que os pêlos púbicos pesem assim tanto! Pelo menos os meus não pesam com certeza….
Disseram que o meu namorado ia adorar e que, depois de experimentar, eu não ia querer outra coisa….

Eu imaginava que fosse doer, porque elas avisaram-me disso. Mas não esperava que por trás disso e quando digo “por trás” é por trás mesmo…havia uma espécie de indústria porno-ginecológica-estética!!!!!!!

- Olá, queria marcar depilação com a Sónia, por favor.
- É para depilar o quê?
- As virilhas.
- Normal ou cavada?
…Silêncio... Eu lá sabia o que era uma virilha cavada. Mas já que era pra fazer, bora lá!
- Cavada. Respondi.
- Amanhã, às... deixe ver...13h. Pode ser?
– Ok. Fica marcado.

O dia em que eu ía perder os tais dez quilos chegou depressa. Confesso que até acordei animada.

Almocei qualquer coisa leve, just in case….sabia lá o que me esperava…

Escolhi umas cuequinhas apresentáveis. E lá fui eu.

Assim que cheguei, a Sónia já estava à minha espera. Uma rapariga alta, esbelta, unhas impecáveis, uniforme claro, giraça.
“Cool”…pensei eu, “Vou ficar como ela”.

Muito simpática, com tom de voz muito meiguinho, pediu que eu a seguisse até o local onde o ritual seria realizado.

Saímos da recepção com o cheirinho relaxante do incenso, passamos por um corredor largo pintado com um verde suave, muito Feng Shui e, por fim, lá chegamos ao nosso cantinho: um cubículo imaculadamente limpo, uma musiquinha Zeeeen, uma maca e do outro lado, uma mesinha com vários potes eléctricos com a cera previamente derretida… ali…de sorriso sarcástico à minha espera.

- Pode deitar-se, por favor.
Despi as calças e, timidamente, fiquei ali… toda esticada em cuecas… na maca branca.

A Sónia mal olhou para mim. Profissionalíssima, concentrada no seu trabalho, virou-se de costas e ficou de frente para a tal mesinha, onde estavam os aparelhos de tortura.

Para além da cera, vi coisas estranhas: uma máquina de cortar cabelo aos tropas, várias pinças, tesourinhas... Meu Deus!!!! Em que é que eu me fui meter?!

De repente, ela veio com uma tirinha de papel celofane na mão. Fingi que sabia perfeitamente o que ela ia fazer com aquilo. Mas, claro que não sabia! Fiquei surpresa quando ela passou a tirinha pelas laterais das cuecas e a amarrou com força. O efeito é do género "cuecas fio dental à frente"…. Tudo exposto.

- Quer muito cavada?
- Sim... quero...

A Sónia deixou então as cuecas a tapar uma fina faixa da Beringela, nome carinhoso pelo qual trato o meu órgão… tinha-me esquecido de fazer a apresentação prévia.

- Os seus pelitos estão muito altos. Vou ter que cortar um bocado, senão vai doer-lhe mais.
- Ah, sim. Claro.

Qual “Claro”, qual carapuça! Não entendia porra nenhuma do que ela estava a fazer. Mas confiei na profissional da coisa.

De repente, ela regressa da tal mesinha de tortura com uma espátula besuntada com um líquido cor-de-rosa, viscoso e quente…
- Pode abrir as pernas.
- Assim?
– Não, querida. Tipo borboleta, percebe? Dobre os joelhos e depois coloque cada perna para o lado.

- Arreganhada, é isso que quer dizer, não é?
Ela riu-se e anuiu. Que situação!!!!!!

E então lá começou a saga!

Passou a primeira camada de cera quente nas minhas virilhas virgens (de depilação, claro está).
Muito quentinho, até agradável…. Até ao momento de ela puxar!

Foi rápido e fatal! Achei que tinha saído a pele toda, que só tinham ficado os ossos na maca. Não tive sequer coragem de olhar! Achei que estava a sangrar por todo o lado....

Até procurei a minha carteira com os olhos, cogitando já a possibilidade de ter que ligar para o cretcheu pra me vir buscar. Se calhar não ia poder conduzir a seguir, pensei.

Pensava isto tudo enquanto tentava concentrar-me na minha expressão facial de «tá tudo controlado» …. Para fingir que, para mim, era tudo super natural, tão a ver?

A Sónia perguntou se estava tudo bem quando notou que eu estava meia roxa e suada. Eu tinha-me esquecido de respirar. Tinha medo que se respirasse ainda doesse mais.
- Tudo óptimo. E consigo?
Ela riu-se novamente como quem pensa "que gaja mais estranha!". Mas deve ter aprendido a ser simpática para manter as clientes.

O processo medieval continuou.

A cada puxanço eu tinha vontade de a espancar e de a tratar do piorio!

Lembrava-me das minhas amigas a recomendar a depilação e imaginava que era tudo um grande complot, só pra me fazer sofrer. Todas recomendam a todos porque não querem sofrer sozinhas, é o que é!
- Quer que tire dos lábios?
- Não, eu quero só as virilhas, o buço não, obrigada.
- Não, querida, os lábios de baixo… aqui ó.
Não, não, pára tudo!

Depilar os tais grandes lábios? Fónix, que ideia!…. Mas concordei. Já que me deitei na maca, agora lixo-me, ponto final.

- Ok. Vamos lá. Arranque lá isso.

É então que ela passa a cera bem lá no meio (no meio, mesmo!) … espera que seque um bocadinho e….PUXA! Não doeu tanto como de lado, mas já mais à vontade, desabafei: “Desta vez saíram ovários e tudo, porra!….”

Não bastasse o meu estado e posição, a esteticista do lado invade o nosso quartinho e dá uma olhadela na minha beringela.
- Tá a ficar fantástica! Como que a incentivar-me.
- Mas tá cheia de pêlos encravados aqui. Ora espreita….
Se tivesse sobrado algum pelinho ali, ele teria balançado com a respiração das duas. Estavam ali, mesmo coladinhas. Que situação!

Fechei os olhos e pedi para que fosse um pesadelo. "Meu Deus, tira-me daqui, teletransporta-me, pleeeeease!".

Só desci à terra quando, entre uns blábláblás, ouvi a palavra “pinça”.
- Vou usar aqui a pinça porque ainda ficaram uns pelinhos, ok?
- Ok. Siga. Já que está tudo dormente e está… já não sinto nada….
Estava enganada!!!! Senti cada beliscadela daquela pinça filha da mãe a arrancar pelinhos resistentes na pele já dolorida. E quis matá-la. Mas mal sabia que o motivo para isso ainda estava para vir.
- Vamos ficar de lado agora?
- ahn?
- Deitar de lado, pra fazer a parte cavada.
Pior não podia ficar. Obedeci. Deitei-me de lado e fiquei à espera de novas ordens.
- Segure o seu rabiosque por favor.
- ahn?
- Esta nádega aqui de cima, puxe bem pra cima para a afastar da outra….
Tive vontade de chorar. Eu não podia ver o que ela via. Mas ela estava de cara para ele, o olho que nada vê. Quantos tinham visto, à luz do dia, aquela cena? Nem a minha ginecologista. Quis chorar, gritar muito, “bufar” na cara dela, como se a pudesse envenenar, pô-la inconsciente...

Fiquei a imaginar a Sónia a acordar a meio da noite a suar…. Com um pesadelo. O marido perguntaria:
- Tudo bem, Sónia?
– Sim... sonhei outra vez com o cu de uma cliente.
Mas de repente fui novamente trazida para a realidade. Senti o aconchego falso da cera quente besuntando o meu Twin Peaks.

Não sabia se ficava com mais medo do puxanço ou com vergonha da situação. Só sei que ela deve ver mil cus por dia. Aliás, isso até alivia a minha situação. Por que é que ela se lembraria justamente do meu entre tantos?

E foi aí que me veio o pensamento: Espera lá….mas eu tenho pêlos no cu?

Fui impedida de desfiar o rol de perguntas. Ela puxou a cera. Achei que o dito tivesse sido todo arrancado pela raiz.

Num único puxão a Sónia arrancou qualquer coisa que tivesse ali.

Mordia a mão e grunhia ao mesmo tempo. Sons guturais, palavrões, preces, tudo junto.
- Vire-se agora do outro lado.
Porra…. por que é que não arrancou tudo de uma vez?
Virei-me e segurei novamente a nádega.
Piorou bastante. A palerma da salinha do lado apareceu outra vez.
- Sónia, podes emprestar-me algodão?
Apenas uma lágrima solitária escorreu dos meus olhos. Era dor demais, vergonha demais. Pudor demais. (Sim…eu!)

Aquilo não fazia sentido. Estava a depilar-me pra quem? Ninguém me ia ver cu tão de perto. Só mesmo a Sónia. E agora a chata da vizinha inconveniente.
- Terminamos. Pode virar-se, por favor, para eu passar com a máquina?
- Máquina de quê?!
- Tipo de barbear….pra pôr o pêlo baixinho, tipo campo de futebol. Fica giro.
- Dói?

-Não. Não dói nada.
- Ok, passe lá essa merda...
- Tire as cuecas, por favor.
Foram dois segundos de choque extremo.

“Tire as cuecas….”, Como é que alguém pode dizer isso sem preliminares? Estou habituda a que me toquem pelo menos nos mamilos quando me dizem isso.

Mas o choque foi substituído por uma total redenção…. Ela já viu tudo e já, qual é o problema de baixar as cuecas? E essa parte não doeu mesmo nada, até foi agradável.
- Prontinha. Posso pôr pó de talco?
- Pode… siga, põe lá a gaja grisalha
- Tá impek! Pode fazer muito ronrom, agora. O seu namorado vai adorar!
Ronronar…ronronar... Eu estava era com sede de vingança!

Admito que o resultado é bonito, lisinho, sedoso. Mas doeu de caraças e, porra…. expus ali a minha “alma”.

Queria era matar as minhas amigas!

Queria tornar-me feminista, morrer peluda, protestar muito, convocar manifs e acima de tudo, levar a aprovação ao parlamento uma lei anti-depilação cavada.

Saí de lá determinada a comprar o domínio preserve-as-beringelas-peludas.com"

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